O Regato

Thursday, April 09, 2015

UM RAIO DE SOL NUMA MANHÃ CINZENTA


A manhã apresenta-se cinzenta e chuvosa. A Maria, com o guarda-chuva debaixo do braço, curvada sob o peso dos seus 87 anos  e envolta na negritude  da sua viuvez, caminha, apressada, pela rua  Joaquim Nunes Ferreira…

Um carro, que passa, pára junto da idosa e uma voz feminina, mais jovem, chama  “Ó  Maria… Onde vais?” No rosto magro e sulcado pela idade, surge um sorriso…  “Ó  ‘mor…  Vou à Casa do Povo  ver se apanho uma consulta…  Mas agora na temos médico…   Tenho andado doente e,  se na apanhar consulta, tenho que pedir aos meus netos p´ra me levarem ao hospital, a Santarém…” -  responde  a idosa.   “Anda connosco no carro, que vais melhor e sempre poupas as pernas…” – convida a voz feminina…

E ela foi…

Com “pompa e circunstância”, a governação celebrou ,  há pouco tempo, o “Dia Mundial da Saúde” …   Mas a  “realidade” dos números  manipulados dos governantes  ignora e despreza a realidade (real) do dia a dia…  Menos salários, menos pensões, menos saúde, menos educação, menos habitação… é a sua política! 

Dizem os jornais  que “os números do INE apontam para uma redução significativa  do número de consultas médicas (menos 2,3 milhões) face a 2002”(JN, 06/04/2015)... Que bom seria se esta redução fosse sinónimo de uma população mais saudável…

Contudo, a realidade (real) é muito diferente. Com esta política governamental de empobrecimento e encerramento de postos médicos, grande parte da população não tem capacidade económica para suportar  os custos cada vez maiores e menos comparticipados de medicamentos, exames, taxas moderadores e transportes…


Se não fosse aquele pequeno raio de sol de solidariedade, teria sido, mesmo, uma manhã muito cinzenta e triste…


A excitação do “momentum”


Oito e meia da manhã. O sol esconde-se de mim atrás das nuvens…
A memória  da chuva, que ontem caiu em abundância,
é visível nas enormes manchas húmidas que enxameiam o chão.

Num passo cadenciado,  subo a Rua do “Vai um”…
Ao meu encontro, descendo a rua,
uma suave brisa começa por excitar-me o olfacto …
Entretanto, de supetão, sou  abraçado, sofregamente,
pelo intenso aroma de flor de laranjeira do pomar que bordeja a rua…

Oh, que “momentum” paradisíaco de êxtase  olfactivo !
Miríades de alvas florinhas ornam as viçosas laranjeiras,
exalando aquele envolvente perfume edénico!
Saboreando, embevecido, o momento, continuo o meu caminho,
retomando o passo cadenciado…

Contudo, o  primeiro espirro , já na rua da escola, arrasta-me, contrariado,
para a realidade da lembrança da minha alergia ao pólen…

Mas… Valeu a pena o “castigo” pela vivência deste “momentum” único !